segunda-feira, 25 de junho de 2012
BRASILEIRO É LOUCO POR FUTEBOL
Brasileiro é louco por futebol.
A verdade estava ali, nua e crua à sua frente. Nua, a sua Rosa, com os olhos semicerrados e o cabelo espinhado em completo desalinho, oscilava freneticamente, possuída e tremula, daquela mesma forma que o fizera endoidecer anos atrás, e esquecer-se da sinuca e companheiros de boemia e samba nas noites de
sexta feira.
Faminta por sexo, a mulata sestrosa o praticava sem pudor e sem barreiras.
Crua, e totalmente em riste, a ponta de lança de Meninão nela penetrava sem retranca, num frenesi tal, que a qualquer instante sairia fogo das virilhas dos dois. Gemiam, junto com a cama meio desmantelada, comprada ha dois dias atrás de um vascaíno raivoso, em cuja padaria Beto tomava café todos os dias, antes de pegar no batente.
Engoliu em seco, com a língua colada no céu da boca.
Marcara com o parceiro para irem juntos ao estádio, dia de decisão, Fla-Flu, jogo fácil, mão na taça e festa pronta na Toca do Urubu, com direito a torresmo e pinga da boa por conta da casa. Mas o dito cujo não deu as caras, deixando Beto a ver navios na entrada de um Maracanã superlotado em vermelho e preto.
O vento gelado daquela noite trouxe-lhe sussurros de suspeitas, fazendo com que dessa meia volta e apressasse os passos na direção do morro, fugindo dos primeiros pingos que começavam a cair. O guarda chuva armado o impediu de vislumbrar a figura soturna de Zé Bodega, dono da vendinha na entrada do emaranhado de vielas, que levava ao topo da colina repleta de casebres de zinco e Madeirit.
A porta, escancarada de repente, fez com que a fêmea fogosa cessasse a doida cavalgada, porém, aterrada e prevendo um final infeliz para aquela noite, entrou em estado de choque, continuando, agora estática e de
olhos arregalados, em cima do franzino moleque, que desmaiado de tanto gozo, ficou preso entre as pernas poderosas que tanto apreciava.
Na TV ligada no único cômodo do barraco, sua outra paixão, partia em contra ataque ferino, entrava em velocidade pelo meio, sem encontrar resistência no adversário. Sobre o tamborete improvisado de criado-mudo, a garrafa de Brahma pela metade assistia a tudo, refletindo a luz intermitente vinda do aparelho, dando ao cenário dramático, conferindo novos tons a cada momento, num misto de cores variadas e brilhantes.
Beto sentiu um leve arrepio percorrer lhe o corpo inteiro e um cheiro doce de sangue, invadiu lhe as narinas misturando-se com o indefectível odor de cerveja misturado ao pó de arroz, que o negrinho ousado e tirado a bacana, usava para irritar os amigos nos dias de vitória tricolor.
Só quando percebeu a rigidez e a frieza do corpanzil da amante foi que Meninão abriu os olhos e percebeu que o jogo estava perdido. Sentiu então o liquido viscoso e quente escorrendo-lhe por entre as bolas. Nem gritou quando o golpe certeiro de caco de vidro foi direto ao seu coração.
Fogos e gritos e rajadas de fuzil invadiram a cabeça chata de Beto, enquanto milhares de mãos o aplaudiam e o canto coletivo ê ô ê ô Nego Beto é o terror vibrava pelo cubículo, trazendo-lhe alento e completa felicidade, acompanhado por bandeiras de todos os tamanhos, com sua imagem impressa em vários formatos.
Todos queriam o seu abraço suado e o seu sorriso banguelo, e davam-lhe amigáveis tapinhas nas costas, uns colocavam em sua boca goles generosos de cachaça enquanto outros entravam e saiam da cena macabra, até que ficou sozinho.
Nada mais importava naquele momento.
Não havia dor, nem lágrimas, nem remorsos, nem lembranças boas ou más para guardar.
Rosa sumira da sua frente, bem como o Meninão.
Juntou garrafas num saco plástico e desceu a encosta sem olhar para traz. Na birosca, lá na entrada do morro, o samba já rolava, cavaco e pandeiro convidando para um novo trago, para um novo dia, e sua galera já o aguardavam com os gritos de é campeão ecoando pelos becos escuros.
A camisa, mais vermelha do que preta, parecia nada dizer e nem foi notada pelos amigos.
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